À moda da casa

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À moda da casa

Estou atravessando o Viaduto Santa Efigênia. Adoro esse lugar. Uma ponte, uma viaduto, essas obras são chamadas em engenharias de obras de arte. Nesse caso, está absolutamente certo. Obra de arte. Um viaduto com mais de 100 anos, inteiramente construído em ferro e totalmente produzido na Bélgica. É muita história. É muita beleza. Obra de arte em todos os sentidos. É um prazer morar aqui tão perto.

Tenho uma sensação ótima quando, sempre vagarosamente atravesso esse viaduto. Me encanta admirar esse trabalho de serralheria. Nesse tempo não se construíam coisas apenas funcionais. Beleza, elegância, sofisticação, deveriam estar presentes. Viaduto Santa Efigênia, exemplo maior de tudo isso. Ainda bem que tiveram o bom senso de tombar esse monumento da cultura de uma época.

À Moda da Casa, nome bem apropriado para uma pizzaria, pequena, gostosa, encantadora localizada bem aqui na saída do viaduto. Venho aqui com frequência. Adoro os sorrisos, adoro a parca iluminação vinda de lamparinas. Curto esse cheiro de fumaça, esses atendentes de uniformes pretos. E só pra lembrar, aqui se serve uma pizza ótima.

À Moda da Casa, minha pizza predileta tem o mesmo nome a da pizzaria. Mozzarella e Parmesão gratinados sobre um arranjo delicioso de pimentões e calabresa. Pessoas sensíveis, que gostem do prazer da simplicidade, da boa conversa, estão convidadas.

Aqui uma mulher pode jantar sozinha tranquilamente sem ser objeto de olhares e comentários. Aqui uma mulher pode se dar ao prazer de apreciar calmamente a jarrinha de tinto da casa.

Hoje passei um pouco do horário, a casa está quase vazia.

Como prevê a etiqueta ele pela minha direita, ofertou uma porção de lindíssimas azeitonas. O prazer da visão precede o prazer do paladar. Lindíssimas, grandes, polpudas.

Levantei o olhar, recebi um sorriso, veio a explicação.

– Por sua fidelidade conosco. Sorri em agradecimento, sem reconhecer o garçom que me privilegiava.

Pouco tempo depois, minha jarrinha de vinho foi substituída. Não havia notado que já havia bebido toda a anterior. Dessa vez apenas a inclinação da cabeça para o lado serviu de justificativa. Trocamos outro sorriso.

Visto meu casaco, me levanto e constato que além da bonachona figura do senhor no caixa, apenas eu e o simpático garçom dividíamos o ambiente.

Outro sorriso trocado e um cumprimento, no mínimo incomum.

– Até breve.

Saio sem pressa, novamente contemplo esse admirável viaduto. Não me sinto inquieta ou apreensiva de andar por aqui sozinha. Parei e fiquei olhando o transito da avenida.

Em três segundos tomei um susto e fiquei surpresa. Como se ainda estivesse sentada a mesa, pelo meu lado direito ele me oferece um bombom. Nem tive tempo de um sobressalto. O mesmo garçom, o mesmo uniforme preto, o mesmo sorriso. Brinquei.

– Mais cortesias? Trocamos outro sorriso.

Ele, bem frente ao meu rosto fez girar a embalagem do bombom e praticamente o colocou em minha boca. Foi um movimento assim como quando um sacerdote lhe oferece uma hóstia. Aceitei.

– Gostei da surpresa. Disse em agradecimento. Trocamos outro sorriso.

Ele ajeitou a gola do meu casaco, se manteve silencioso e sem tirar as mãos da minha gola, me beijou os lábios. Sim um beijo quase fraternal. Não tive a menor condição, ou mesmo vontade de recusar.

– Moro muito perto, aceita um café?

Quem nunca tomou uma atitude intempestiva? Porque ser sempre 100% racional? Aceitei as azeitonas, o vinho o bombom. Aceitei o beijo aperitivo, porque não aceitar uma aventura inusitada.

Estávamos na sala do meu apartamento. Continuávamos num relacionamento parecido com o da pizzaria, muitos sorrisos, muitos agrados, quase sem palavras.

– Gosto muito da pizza de vocês. Queria conversar.

– Sabe quem prepara a massa? A resposta me foi dada de forma gestual. Com as mãos espalmadas sobre minhas costas, ele massageava, subia, descia, apertava. Se farinha e água fossem humanizadas estariam, como eu com um tesão incrível.

– Comece pelas bordas. Esse gastronômico aviso precedeu mordidas, chupadas e beijos nos ombros e pescoço. Ele permanecia por cima de mim e determinava.

– O mais importante é a cobertura. Frase ambígua, duplo sentido, sei lá. Estou  com muito tesão para ficar conjeturando.

Não havíamos tirado uma única peça de roupa. Me sentia com um pizza dentro da embalagem. Quente, quentinha esperando ser saboreada.

Ainda sobre as minhas costas ele subiu minha saia me agarrou pela cintura, levantou meu corpo e sussurrou.

– O forno deve estar bem quente, bem quente.

Certamente o forno era a minha buceta. A temperatura estava do jeito que ele queria, entrou, urrou e só elogiava. Ouvi sobre minhas carnes todos os frequentes elogios aplicáveis a um prato de alta gastronomia.

– Gostosa, delicia, quente, saborosa. Senti seu êxtase sendo jogado no meu corpo ouvindo um longo urro quase surdo, finalizado com ele desabando sobre meu corpo e dizendo… delicia.

Achei que merecia uma sobremesa. Coloquei aquele homem em minha boca, suguei o quanto quis.

Depois de recompostos, acompanhei aquele garçom que me serviu de tanto prazer até o elevador. Voltei para a sala, fui até a janela, fiquei admirando meu querido viaduto por onde agora seguia aquele macho gostoso de quem minhas carnes já começavam a sentir saudades.

 

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Cako Machini
Cako Machini
Desde 1953 também responsável pelo mundo que vivemos. Publicitário, marqueteiro, empresário. Criativo, amante das artes. Resolvido a viver o Outono de sua Vida junto a natureza, priorizando as palavras e as viagens.

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