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23 de agosto de 2018

Vacas Gordas

 

Vacas gordas é um distrito do município de Urubici. Minúsculo povoado onde encontramos calor humano, muita poesia e neve.                                                                   Vacas Gordas não tem padaria, farmácia nem mercado. Lá mora um povo fraterno, hospitaleiro e apaixonado que reclama do descaso das autoridades em reconhecer que naquele distrito neva muito mais do que em Urubici, Urupema ou em São Joaquim.

Visitar Vacas Gordas é confirmar nossos conceitos sobre viagem. “Prefira sempre fazer um Roteiro, que é sempre tão ou mais interessante que o Destino”. “Não tenha pressa, ande de mente e olhos muito abertos. Curiosidades e Novidades não estão sinalizadas na estrada.

Saímos de Urubici com destino a São Joaquim. Percurso pequeno, 61 km. Muito menor ainda era a temperatura. A sensação térmica, devido ao vento e a garoa, sugeria estarmos bastante abaixo de zero. Quem garante que você percorrerá essa estrada outra vez? Então fique atento a tudo!

Fiquei intrigado por ver um boller sobre o telhado de praticamente todas as casas. Só que eu não via as placas de captação de energia solar. Nosso carro está sempre lotado, mas não carrega dúvidas. Quando vimos a sinalização do acesso rodoviário para Vacas Gordas, e constatamos que o povoamento era muito próximo, aliás visível da estrada, resolvemos visitar o vilarejo e entender o processo de aquecimento de água.

Estávamos trafegando, vagarosamente, naquela que poderia ser chamada de Rua principal. Vinha em sentido contrário uma moto. Seu condutor parou esperando ser abordado. Trocados os cumprimentos ele nos perguntou se procurávamos por alguma pessoa. Vacas Gordas é um daqueles locais onde é mais fácil dizer o nome do que o endereço de quem se procura.

 

Respondi que só estava conhecendo o lugar, que estávamos viajando e conhecendo a Serra Catarinense. A intermitente garoa deu uma pausa, desci do carro. Aproveitei da certeira vontade de conversar de um morador de um local tão pequeno e engrenei uma prosa. Já nas primeiras frases ouvi as queixas sobre o isolamento do distrito e a falta de reconhecimento pela quantidade de ocorrência de neve do local.

Indaguei e tive minha curiosidade satisfeita. Os moradores da Serra Catarinense podiam se credenciar num programa do governo chamado “Banho de Energia”, baseado na sacada do catarinense José Alcino Alano que revitalizando o tradicional costume de passar uma serpentina pelo fogão a lenha, colocou a serpentina no conduto da chaminé. Dessa forma a água é aquecida pelo calor que seria disperso pela chaminé, sem reduzir o calor da câmara do fogão. O boller acumula água quente, aquecida pelo calor da queima do fogão a lenha e não do calor do sol. Aliás, pensar em aquecimento solar no alto da serra catarinense era uma premissa muito pouco viável.

Tenham certeza que meu novíssimo amigo estava empenhado em me colocar a par de cada detalhe do seu amado distrito.  Convidei-o para um café. Fui informado que em Vacas Gordas não existe nem padaria nem lanchonete. Estava quase aceitando o convite para conhecer o armazém do Mané Gordo, que sempre recebe os clientes com café quente, quando notei que a Beth estava dentro do quintal de uma das casas conversando com uma senhora bem idosa.

Beth saiu do carro e ficou fotografando o local. Ela estava encantada com a quantidade de “Suculentas” que enfeitavam os muros, e as calçadas. Dona Vânia Schalk vendo a Beth fotografar as suculentas da fachada de sua casa, se aproximou, puxou conversa com a Beth e a carregou par ver as plantas de sua varanda. Agora agindo como se já fossemos íntimos, chamou a mim a seu vizinho para sua casa. Lá, eu e a Beth, os forasteiros, fomos apresentados as “Taipas”.

Taipas são muros construídos somente com pedras. Medem +- 1 metro de altura e servem (como cercas ou muros) para demarcar e dividir as propriedades. Nos foi contado que esse era um hábito muito antigo. Os fazendeiros, ou como é dito na região, os estancieiros mandavam construir esses muros para separar as propriedades, ou demarcar caminhos. Falam que as taipas começaram a serem erguidas quando a coroa portuguesa resolveu fundar a cidade de Lajes para garantir a soberania do território sempre em conflito com os espanhóis.  _________________________________________________________                                    Quem se encanta quando encontra equilíbrio entre as ações do homem e os caprichos da natureza precisa conhecer a Serra da Graciosa, a primeira estrada do estado do Paraná.  ____________________  

Mal comparando a construção das taipas tem a rusticidade da construção das pirâmides. A terra era revolvida, as pedras desenterradas e levadas ao local da construção por uma junta de bois. Tudo muito precário nos recursos nas não na técnica. As Taipas não são amontoados de pedras, existe um processo de encaixe para que os muros não desmoronassem Existe até hoje o ofício de “taipeiro”.
Em tempos mais recentes as taipas continuaram a serem erguidas com a mesma finalidade. Hoje em Vacas Gordas elas fazem as divisas entre propriedades até mesmo urbanas. Nesse caso ganharam um incremento encantador. Na parte superior das taipas foram plantadas suculentas.

Foi a associação da tradicional taipa com a beleza e variedade das suculentas que aproximou e apaixonou a Beth.

Suculentas são plantas incríveis em todos os sentidos. Belas e vigorosas. Todas as partes dessa planta têm a capacidade de armazenar uma quantidade enorme de água. O número de variedades é incontável. A reprodução se dá simplesmente pela queda de uma folha no solo. Essas características permitem sua sobrevivência em lugares completamente inóspitos.  As suculentas são a versão poética dos cactos.

Vemos suculentas em pequenos arranjos, em terrários. Ver suculentas ornando os muros de taipas por dezenas de metros é coisa apaixonante.

A exaltada super panacéia Aloe Vera, chamada pelos mais íntimos de Babosa, saibam, também é uma espécie de suculenta. As místicas Espada de São Jorge, Lança de Ogum, são outras variações do amplo espectro dessa espécie.

Generosamente, carinhosamente, Dona Vânia nos ofereceu pinhão (adoro pinhão), e com entusiasmo partilhou conosco uma garrafa de um excelente vinho produzido pela Vinícola Pericó batizado de Taipa (vejam abaixo). Dona Vânia acaba demonstrando paixão pelo fato do vinho ter sido batizado com o nome de um elemento tão presente em seu cotidiano: Taipa.

Tão apaixonante que hoje aqui na chácara a Beth em mais de duas dezenas de vasos que contém dezenas e dezenas de variedades diferentes entre si. 

A beleza, a excentricidade dessas plantas é inversamente proporcional a dificuldade ou trabalho dispensado em seu manejo. Elas estão sempre exuberantes se cuidarmos se não cuidarmos, ou apesar dos nossos cuidados. As suculentas se reproduzem com facilidade e velocidade. Já tivemos o prazer de presentearmos muitos amigos com vasos de suculentas produzidas por nós.

De coração, cada leitor está convidado a nos visitar conhecer nossas suculentas.

Homenageando Vacas Gordas, temos aqui em casa a reprodução de um “muro” de suculentas. Criamos um canteiro chamado de jardim das pedras e estamos construindo a Praça Vacas Gordas.

         #*#*Falando sobre enorme incidência de plantas de uma mesma espécie, quem gosta (praticamente todos) dos caprichos da natureza deve ler sobre a incidência de bromélias na cidade de Tapiraí. Acesse, vale a pena.

        

Aqui na nossa chácara a RPS do Xingu (Republica Popular Socialista do Xingu), estamos estudando  instituir a suculenta como planta símbolo. A questão maior está sendo definir qual das suas milhares de variedades deve ser retratada. Por favor, você como leitor amigo e também fã das suculentas, poderia   escrever opinando sobre a questão.

Definitivamente. Maduro não viaja, curte. Maduro percorre. Maduro aprendeu a ver (até por que existe) poesia e beleza em tudo. Maduro tem sempre muito mais a contar.

 

      

       

             

Cako Machini
Cako Machini
Desde 1953 também responsável pelo mundo que vivemos. Publicitário, marqueteiro, empresário. Criativo, amante das artes. Resolvido a viver o Outono de sua Vida junto a natureza, priorizando as palavras e as viagens.

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